sábado, 27 de novembro de 2010

A origem do plágio

Falar de plágio entre alunos do ensino fundamental, médio e mesmo superior se tornou "chuva no molhado". Os professores normalmente gastam horas de persuasão terrorista tentando fazer com que os alunos entendam a gravidade da cópia indiscriminada de textos sem a devida referência ao trabalho de origem. Porém pouco eu vejo se discutir a respeito da origem desse desprendimento para a cópia pura e simples de conteúdo. 

Em época de Internet, Wikipédia e Google, fica muito fácil ter acesso a qualquer área do conhecimento, nos seus mais diversos níveis de abstração. Ao se solicitar a pesquisa sobre um determinado assunto a um aluno, a simples digitação deste assunto em um mecanismo de busca gera material suficiente para um livro inteiro sobre o assunto.

É neste momento que o aluno se pergunta: por que vou escrever com as minhas palavras aquilo que outro escreveu de forma muito mais competente e com mais autoridade que eu? É por não encontrar resposta para esta pergunta que o aluno plagia. 

Esta pergunta emerge como resultado de um processo que se iniciou desde o primeiro dia de escola de uma aluno, nas séries iniciais.

Os alunos que hoje estão cursando o ensino superior, e até mesmo alguns em cursos de pós-graduação, foram moldados por processos de ensino e aprendizagem baseado na absorção pura e simples de uma série de conteúdos, que muitas vezes tinha pouca relação com a sua realidade, o que se acentuava no ensino médio (até hoje eu não vi utilidade no conhecimento dos processos de mitose e meiose, que se quer lembro como funciona).  Mesmo alguns conteúdos que poderiam ser abordados estabelendo conexões mais fortes com o contexto do aluno, como língua portuguesa e matemática, eram tratados segundo um receituário padrão, definido por uma cartilha ou livro-texto, fragmentando-o em artefatos de conhecimento que só faziam sentido dentro daquele fragmento de conhecimento. O resultado disso é que se criavam dois universos na cabeça do aluno: o universo real, com a família, amigos a hora do recreio e que nada tinha haver com o outro universo, aquele da sala de aula em que ele era obrigado a decorar pra poder ganhar uma bicicleta no final do ano. Ao fim, este era o grande motivador: passar por média para ganhar a bicicleta.

Nesse contexto, atividades que demandavam maior independência do aluno eram as pesquisas solicitadas pelos professores em que se passava uma tarde dentro de uma biblioteca copiando trechos de livros formando textos "Frankenstein" sem a devida articulação de idéias e, principalmente, sem uma análise crítica dos processos que levaram a construção daquele conhecimento.

De fato, este se tornou o grande calcanhar de Aquiles destes processos: nada era feito no sentido de trabalhar no aluno o senso crítico e os processos de construção de conhecimento através de métodos orientados a problemas, de modo a demandar do aluno a síntese das diversas áreas do conhecimento com a qual lidava na escola, e mesmo fora dela. Faltava a criação de mecanismos que inserisem o contexto de aprendizado e a realidade do aluno dentro da ciência.

Em resumo, o professor dizia para o aluno o que deveria aprender, descrevia esse conteúdo no quadro negro, o aluno copiava, memorizava e depois cuspia tudo em uma prova. Quanto mais próximo da compreensão que o professor tinha daquele assunto, melhor a avaliação do aluno e mais estrelinhas ele ganhava na prova. Assim, o conhecimento adquirido pelo aluno se limitava aquilo que o professor sabia do assunto.

Depois de 12 ou 13 anos sob esta sistemática o aluno chega à universidade. O resultado disso é uma aluno moldado com a idéia de que o fim é a nota da prova e a nota de final de ano/semestre. A universidade, a sala de aula, é um espaço com um fim em si mesmo, em que tudo gira em torno da repetição de conceitos, idéias, processos expressos em algum momento pelo professor. O desafio é simplesmente obter a média para a aprovação nas disciplinas, e consequentemente, ao fim de 4 ou 5 anos, a obtenção de um diploma.

Em meio a esta realidade, atividades que demandam o senso crítico dos alunos são reveladoras do seu desconforto frente a este tipo de demanda. Nesta hora, o conhecimento é uma peça estática modeladora de uma realidade que não condiz com o seu histórico, sua realidade e/ou seu futuro. Não há um contexto que o permita vislimbrar sua utilização, a não ser pela avaliação do professor. Devido a esta lacuna, o sujeito plageia, muitas com a melhor das intenções e entendendo que está fazendo o melhor traballho possível.

A preguiça de pensar, defendida por muitos professores como justificativa para o plágio, é na verdade o resultado de um processo que podou do sujeito a capaciade de questionar a sua realidade, que deve ser  o principal produto de qualquer processo de aprendizagem. Ou seja, a inclusão do aluno em um ambiente de prática científica, em que o conhecimento que ele trabalha hoje é na verdade o resultado de um processo de construção que surgiu junto com o homo sapiens, e que á algo por natureza incompleto, inacabado, e consequentemente, em constante evolução.

A pergunta que deixo é: como reverter este processo em um sujeito que já se encontra no ensino superior?